DIÁRIO - 06/04/1990 –
Cada dia é
especial por si
Um novo sol
nascendo
Um novo sol
se pondo
Seja por
mais um dia de Vida
Com um novo
sentir e pensar
Como por
mais um instante de contemplação do eterno
A natureza
(Vida) segue o seu curso
Vivendo e aprendendo
a viver
A Perfeição
do Real.
Em Corumbau
havia um único armazém, que até tinha o que precisávamos – que não era muito,
mas que era bem mais caro. Assim sendo, uma vez por mês Gilberto ia até a
cidade de Itamaraju para fazer as compras. Ele fazia questão de ir para poder
matar sua vontade de comer pizza, dentre outras. Assim, no dia apropriado, eu e
Marquinhos seguimos para encontrar com Gilberto no seu retorno, a fim de
ajudá-lo a carregar as compras, que desta vez viriam na minha mochila. Para
tanto, precisávamos caminhar 6 km até a Vila de Guarani, aonde o ônibus chegava
de Itamaraju. Quase todo o caminho era pela praia e, mais adiante, cruzamos com
três garotas, sendo que uma delas me chamara a atenção. Seguimos em frente e
quando chegamos ao ponto final do ônibus, não encontramos Gilberto para nossa
surpresa. Aproveite e matei minha
vontade de comer um chocolate, mais precisamente um Chokito, velho, seco e
esfarelando, mas delicioso.
Informaram-nos
que viram o Gilberto indo pela estrada e não entendemos, pois pela estrada era
muito mais difícil a caminhada, uma vez que a areia era muito fofa. Somente
carros tracionados passavam por ali. Pouco depois encontramos Gilberto
estatelado no chão, pois além do peso o calor era intenso. Sem falar que
Gilberto era um cara muito magro, daqueles que as costelas costumam curvar-se
para dentro, de tão magro. Perguntei:
- Porque
você veio por aqui?
- É que
tinha umas minas e eu segui elas.
- To vendo
que seguiu.
Logo
adiante, já na areia da praia, alcançamos as meninas e as ajudamos a carregar
suas bagagens. Papo vai, papo vem e as convencemos a acampar no melhor local de
Corumbau, com o único chuveiro existente. Tinha até uma barraca já montada.
Assim, Sandra, uma morena alta; Lucia, a loirinha que me chamara à atenção e
Roseana, uma alegre baixinha e gordinha, passaram a fazer parte do acampamento
e da nossa convivência. Era um feriado de Páscoa e logo também chegara uma
escuna, vinda de Porto Seguro, com mais turistas.
O motivo das
meninas estarem ali era que Sandra havia comprado um terreno naquela região.
Quanto a Lucia e Roseana, como estavam desempregadas e sem rumo certo,
resolveram se aventurar e quem sabe abrir algum negócio na praia.
A presença
das meninas deixara os meninos excitadíssimos. E eu me sentia profundamente
ligado à loirinha. Não me saia da cabeça a primeira vez que a tinha visto, pois
do olhar dela havia visto muita luz no entorno. É como se os olhos dela
brilhassem, como se eles tivessem me iluminado, como se fossem dois sois. A
todo o momento nossos olhos se encontravam e pareciam se comunicar com clareza,
como que magnetizados. Eu ficava na minha e ela na dela, não nos falávamos
muito. Sua aparência, por vezes, era séria e desconfiada. Na primeira noite,
antes de dormir, deitamos todos fora da barraca, olhando o maravilhoso céu, nos
conhecendo um pouco com um papo deliciosamente natural e despretensioso.
No dia
seguinte fomos com elas até o terreno e nossos olhares viviam se encontrando e
se mostrando. Mais à noite fomos a uma festa não muito longe, onde um
fazendeiro local iria matar um boi e patrocinar a festança. Lucia não me dera
muita bola, no entanto nossos olhares viviam se cruzando. Na volta, com uma lua
cheia maravilhosamente inesquecível nascendo no horizonte do mar, não
resistimos e tomamos banho. Apenas eu e Roseana, que estava completamente
bêbada, dizendo que queria dormir comigo. E assim foi, pois estava difícil
dormir as três numa barraca para dois.
O dia
amanheceu igualmente lindo e Sandra, dizendo estar cansada de se trocar
deitada, sem pudores coloca seu biquíni em pé fora da barraca, para espanto de
Gilberto, que se ajoelha no chão e faz menção de rezar, dizendo:
- Obrigado
Senhor por esta visão. Há muito tempo que não via e continua igual. Muito
obrigado.
E todos
caíram na gargalhada. Logo depois, Carica, um pescador carioca, que também se
radicara ali, e de vez em quando aparecia no acampamento para papear, me
indagou ao ver Roseana saindo de minha barraca, numa ressaca daquelas:
- E aí
Russo! Como foi?
Carica
costumava me chamar assim, talvez pelo tom avermelhado do meu cabelo e barba.
Respondi:
- Não aconteceu nada.
- Como não?
- Eu quero a
loirinha – sentenciei.
E chegou a
terceira e última noite das meninas no acampamento, uma vez que elas
conseguiram carona com a escuna, que partiria no dia seguinte cedo. Após a
última noite de festa, onde cruzara com o olhar de Lucia apenas algumas vezes,
e a vendo conversando com um dos rapazes da escuna, sem saber ao certo. Ao
final, voltei para o acampamento e me sentei num tronco em frente à minha
barraca. Algum tempo depois ela chegou, sentou-se do meu lado, nos olhamos e
nos beijamos calorosamente. Que beijo gostoso! Entramos na barraca e tive uma
noite inesquecível, onde dormimos o sono dos amantes, das almas que se
reencontram. Alquimia perfeita.
O dia
amanheceu e rapidamente ela se despediu, dirigindo-se para a escuna, que logo
partiria. Pouco depois, eu, em pé na proa do barco a motor de Caiçara, saia
para pescar e a via mais uma vez na escuna, feliz por tê-la conhecido.
DIÁRIO – 17/04/1990 –
Mulher. Como anseio por ti! Sei que
não devemos forçar a barra com os futuros acontecimentos, deixando a cargo do
bom Deus o pão nosso de cada dia como sendo o melhor alimento. Mas por ti mulher, anseio em cada
instante de minha vida. Não apenas por mim, mas por nós que somos um só. Por
mais forte que esteja, seguirei o meu caminho, mesmo que este anseio perdure
por toda esta existência, pois sei que por mais que tarde, você virá. Pois
sabes que te amo como a mais bela das flores que és, com toda a pureza de nosso
ser, eterno casamento, que se aproxima a cada dia.
DIÁRIO – 11/05/1990 –
ANDARILHO
Caminhando
por estradas estranhas
Na busca da
paz de um abrigo
Ao raiar de
um novo dia
Descobrindo-se
mais e mais
Me
reconheço na natureza
Na
perfeição da Criação
Quero a
verdade do viver
Para
encontrar a paz do existir
Sendo o que
sou
Por amor eu
nasci
Vivo para
amar
A luz do
real.